A história do futebol é recheada de “e se…”, e a trajetória de Martín Palermo, um dos maiores ídolos do Boca Juniors, com certeza tem um capítulo intrigante envolvendo o Cruzeiro. O atacante argentino, hoje técnico do Fortaleza, está prestes a reeditar um confronto histórico contra a Raposa neste sábado, mas poucos se lembram que a relação entre “El Loco” e o clube celeste poderia ter tido um desfecho completamente diferente há quase três décadas. Uma tentativa de contratação em 1996, que quase trouxe o jovem e promissor goleador para Belo Horizonte, é um dos fatos mais curiosos que ligam as duas potências do continente, demonstrando como o destino por vezes molda as carreiras e as glórias que se seguirão.
O Destino Quase Azul: Quando Palermo Poderia Ser da Raposa
No efervescente cenário do futebol sul-americano de 1996, o Cruzeiro vivia um momento de reestruturação. Após a conquista da Copa do Brasil daquele ano, a Raposa viu um de seus principais artilheiros, Marcelo Ramos, ídolo da torcida, ser negociado com o PSV, da Holanda. A necessidade de encontrar um substituto à altura para o ataque fez com que o departamento de futebol celeste, liderado pelo então presidente Zezé Perrella, buscasse alternativas no mercado. Foi nesse contexto que o nome de Martín Palermo, à época um jovem centroavante do Estudiantes de La Plata, surgiu como uma indicação promissora.
O empresário Carlos Arini, profundo conhecedor do futebol argentino, foi quem inicialmente sugeriu o nome de Palermo a um colega. Arini acompanhava de perto as atuações do atacante pelo Estudiantes, clube pelo qual Palermo nutre grande carinho. Embora a indicação não tenha se concretizado em um contato direto com a diretoria do Cruzeiro por parte de Arini, o interesse no jovem talento argentino foi real por parte do clube mineiro. Zezé Perrella, em depoimento, confirmou a investida, revelando que tentou ativamente trazer Palermo para o Brasil. “Fui atrás, quis contratar”, afirmou o ex-dirigente, evidenciando a seriedade da intenção cruzeirense de ter o promissor atacante vestindo a camisa azul e branca.
No entanto, o sonho da torcida cruzeirense de ver Palermo no Mineirão não se concretizou. Segundo Perrella, o Estudiantes já possuía um compromisso prévio com o Boca Juniors, o que impossibilitou a negociação. O Cruzeiro, portanto, chegou “um pouco atrasado” na disputa pelo atacante. Aquele momento marcou uma encruzilhada na carreira de Palermo: ao invés de Belo Horizonte, o destino o levaria para La Bombonera, onde se tornaria uma lenda. O mercado de transferências, com suas nuances e prazos, impediu que o promissor atleta se tornasse parte da história do Cruzeiro, que, por sua vez, seguiria em frente para conquistar a Copa Libertadores no ano seguinte, em 1997, mostrando sua resiliência e capacidade de superação mesmo sem o desejado reforço argentino.
A Explosão de um Ídolo e os Primeiros Encontros com o Cruzeiro
O que poderia ter sido uma passagem pelo Cruzeiro se transformou em uma ascensão meteórica com a camisa do Boca Juniors. Martín Palermo não apenas se tornou um ídolo xeneize, mas o maior artilheiro da história do clube, com impressionantes 237 gols. Sua capacidade de balançar as redes, sua presença de área e sua personalidade marcante o transformaram em “El Loco”, uma figura reverenciada pela apaixonada torcida do Boca e temida pelos adversários em todo o continente.
Curiosamente, antes mesmo da tentativa de contratação em 1996, Palermo já havia cruzado o caminho do Cruzeiro. Em 1994, ainda como jogador do Estudiantes, ele enfrentou a Raposa pela Supercopa da Libertadores. Naquela ocasião, o time celeste saiu vitorioso contra a equipe argentina, um prenúncio dos futuros embates históricos. Contudo, o reencontro mais simbólico, após a frustrada negociação, aconteceu justamente na estreia de Palermo pelo Boca Juniors. Em 1997, pela Supercopa da Libertadores, o atacante fez seu primeiro jogo com a camisa azul e ouro de seu novo clube, e o adversário era ninguém menos que o Cruzeiro, na Bombonera. Naquele confronto, o Boca levou a melhor, vencendo por 1 a 0, em um marco para a carreira do artilheiro e mais um capítulo na rivalidade continental.
A história de Palermo com o Boca se entrelaçou com conquistas grandiosas: duas Copas Libertadores, duas Copas Sul-Americanas e um Mundial de Clubes em 2000, onde marcou os dois gols da vitória sobre o poderoso Real Madrid. O atacante se consolidou como um dos nomes mais emblemáticos do futebol argentino, um verdadeiro carrasco de defesas e colecionador de títulos. Enquanto isso, o Cruzeiro também seguia sua trajetória de glórias, como a já mencionada Libertadores de 1997, consolidando-se como um dos grandes clubes do cenário sul-americano, o que tornava cada reencontro com Palermo e o Boca ainda mais carregado de significado.
Reencontros Épicos na Libertadores: O Matador Contra a Raposa
A mística da Copa Libertadores da América sempre proporcionou confrontos inesquecíveis, e o ano de 2007 trouxe mais um capítulo marcante na relação entre Martín Palermo e o Cruzeiro. Naquele ano, as oitavas de final da competição colocaram frente a frente novamente a Raposa e o Boca Juniors, com “El Loco” em pleno auge de sua idolatria. O confronto era um dos mais aguardados, com o atacante argentino já consolidado como um dos maiores jogadores de sua geração e líder inconteste do Boca Juniors, uma verdadeira força do futebol continental.
Palermo foi figura central nos dois jogos daquele mata-mata. Na partida de ida, na Argentina, o Boca Juniors conquistou uma vitória por 2 a 1. Na volta, no Mineirão, a torcida celeste esperava uma reação, mas o destino reservava mais uma atuação decisiva do camisa 9 xeneize. Martín Palermo marcou um dos gols da vitória do Boca por 2 a 1 sobre o Cruzeiro em pleno Gigante da Pampulha, selando a classificação argentina para a próxima fase e adicionando mais um gol importante à sua vasta coleção em jogos continentais. A Raposa, apesar de lutar bravamente, não conseguiu reverter o placar agregado e foi eliminada pelo clube que se tornaria campeão daquela edição da Libertadores, com Palermo sendo uma de suas peças-chave. Essa performance apenas solidificou a reputação de Palermo como um jogador de grandes jogos e reforçou a ideia de que, talvez, o Cruzeiro tivesse perdido uma peça fundamental em sua história por conta daquele “quase” em 1996.
Esses duelos na Libertadores de 2007 não foram apenas confrontos esportivos; eles representaram a consolidação de uma rivalidade construída ao longo dos anos, com Palermo no centro de muitos desses embates. A capacidade do atacante de decidir partidas em momentos cruciais, especialmente em palcos como o Mineirão, só engrandecia sua lenda. Para a torcida cruzeirense, a figura de Palermo era sinônimo de um adversário implacável, um matador nato que raramente perdoava as defesas adversárias, especialmente em jogos de tamanha importância e peso histórico.
De Artilheiro a Comandante: Palermo e o Novo Desafio no Brasil
Com a aposentadoria das chuteiras, Martín Palermo trilhou um novo caminho no futebol: a carreira de treinador. Após experiências em clubes como Godoy Cruz, Arsenal de Sarandí e Aldosivi na Argentina, além de uma passagem pelo futebol chileno, “El Loco” aceitou o desafio de sua primeira experiência no comando técnico de uma equipe brasileira. O Fortaleza, clube em ascensão no cenário nacional e com grande visibilidade internacional nos últimos anos, abriu as portas para o ex-atacante, depositando nele a confiança de liderar o projeto do Leão do Pici.
Desde sua chegada ao futebol brasileiro, Palermo tem mostrado sua filosofia de jogo e sua paixão pela competição, adaptando-se às peculiaridades do Campeonato Brasileiro e da Copa Sul-Americana. Com seis jogos à frente do Fortaleza até o momento, o novo treinador busca imprimir sua marca na equipe, que é conhecida por sua intensidade e organização tática. E, como o destino gosta de pregar peças, a tabela do Campeonato Brasileiro reservou um reencontro mais que especial para Palermo: enfrentar o Cruzeiro novamente, mas desta vez, da área técnica.
O confronto agendado para este sábado não é apenas mais um jogo da temporada. Para Martín Palermo, representa mais um capítulo em sua longa e intrincada história com o Cruzeiro. De um jovem promissor que quase vestiu a camisa celeste, a um carrasco em campos sul-americanos, ele agora retorna ao cenário brasileiro como comandante de uma equipe aguerrida. O embate entre Fortaleza e Cruzeiro, com a presença de Palermo no banco de reservas do Leão, adiciona uma camada extra de emoção e significado histórico a um jogo que já seria de grande importância para ambos os times. A partida é um testemunho da capacidade do futebol de conectar passado, presente e futuro, e de como certas figuras se tornam eternamente ligadas a clubes e rivalidades.
A saga de Martín Palermo e o Cruzeiro é um exemplo fascinante de como o futebol é moldado por decisões, oportunidades perdidas e reencontros inesperados. Desde a quase contratação em 1996, passando pelos duelos épicos na Supercopa e na Libertadores, até o atual embate como treinador, a relação entre “El Loco” e a Raposa é uma tapeçaria rica em emoções e reviravoltas. Neste sábado, o palco estará montado para mais um capítulo, onde a nostalgia do passado se mistura com a efervescência do presente, prometendo um espetáculo que transcende as quatro linhas do campo e relembra a imprevisibilidade e a magia do esporte mais popular do planeta. É a história sendo escrita e reescrita, com Palermo sempre como um protagonista central quando o Cruzeiro está em pauta.

Escritor especializado em cobrir notícias sobre o mundo do futebol. Apaixonado por contar as histórias por trás dos jogos e dos jogadores







