## O Sonho Interrompido: A Frustração de Kauê e o Fim Precoce de Uma Carreira no Corinthians
O futebol, para muitos, representa a concretização de um sonho, a realização de anos de dedicação e talento. No entanto, para Kauê Moreira de Souza, ex-jogador das categorias de base do Corinthians, essa paixão se transformou em um profundo sentimento de frustração. Aos 24 anos, o jovem teve sua carreira profissional interrompida antes mesmo de poder desfrutá-la plenamente, alegando negligência médica por parte do clube em relação a sérias lesões no joelho direito. Essa situação impactou não apenas seu futuro no esporte, mas também sua vida cotidiana, levando-o a buscar um recomeço longe dos gramados.
A trajetória de Kauê no Corinthians, que começou em abril de 2019, com o objetivo de integrar o time Sub-23, rapidamente tomou um rumo inesperado. O que se apresentava como uma promissora oportunidade de crescimento no mundo do futebol, com um contrato inicial de R$ 3 mil que posteriormente foi elevado para R$ 12 mil devido a boas atuações, desmoronou em meio a lesões e tratamentos que, segundo o atleta, foram ineficazes. A esperança de ascender ao time principal e se firmar como profissional foi ofuscada por dores persistentes e limitações físicas, culminando em um desfecho amargo e inesperado.
A batalha judicial travada por Kauê resultou em uma condenação do Corinthians a pagar uma indenização significativa por danos morais, além de uma pensão mensal de R$ 12 mil até que ele complete 35 anos. O montante total devido ao ex-atleta ultrapassa a marca de R$ 2,5 milhões, um reflexo da gravidade das consequências que as alegadas negligências médicas tiveram em sua vida. Essa decisão judicial abre um novo capítulo para Kauê, onde a prioridade agora é a recuperação e a reconstrução de sua vida.
O Início de um Pesadelo: A Lesão e o Tratamento Inicial
Nascido e criado em Diadema, Kauê construiu suas bases no futebol passando pelas categorias de base de clubes renomados como Santos, São Paulo e São Bernardo, antes de desembarcar no Parque São Jorge. Aos 18 anos, a chegada ao Corinthians era vista como um salto qualitativo em sua carreira. No entanto, o primeiro semestre de 2021 marcou o início de um tormento. Durante uma atividade de treinamento rotineira, uma torção no joelho direito, resultado de um “encontrão”, desencadeou uma dor intensa e limitante. O atendimento inicial no departamento médico do clube, descrito por Kauê como baseado em avaliações superficiais (“no achismo”), não apresentou resultados imediatos. A recomendação era de um período de fisioterapia, mas a dor persistia, impedindo-o de se movimentar com normalidade.
As ressonâncias magnéticas realizadas em maio de 2021 confirmaram a gravidade da lesão, diagnosticando tendinopatia patelar e espessamento fibrocicatricial do ligamento colateral medial. Diante do quadro, a decisão do departamento médico do Corinthians foi por um tratamento conservador, sem intervenção cirúrgica imediata. Contudo, os meses seguintes, de maio de 2021 a fevereiro de 2022, foram marcados pela ausência de melhora significativa sob os cuidados dos fisioterapeutas da base. Curiosamente, durante esse período, Kauê chegou a ser emprestado ao Marcílio Dias, mas não teve sequer um minuto em campo no Campeonato Catarinense, evidenciando a persistência de sua condição física.
A Espera e as Cirurgias: Uma Busca por Alívio que Não Chegou
A primeira cirurgia no joelho direito de Kauê só ocorreu em março de 2022, cerca de 11 meses após a lesão inicial, e foi realizada por Joaquim Grava, à época consultor médico do Corinthians. Apesar da intervenção, as dores persistiram, e o atleta relatou que a situação parecia ter piorado. A preocupação aumentava, pois a cirurgia, que deveria ser uma solução, parecia ter agravado o problema, com a sensação de que uma lesão que era descrita como “urgente” não foi tratada com a celeridade necessária. O medo de um rompimento do tendão e a presença de uma fissura no osso da patela tornavam o quadro ainda mais delicado.
Em julho de 2023, mais de dois anos após a lesão, uma segunda cirurgia foi realizada, novamente com Joaquim Grava. Pouco antes desse procedimento, Kauê havia sido promovido ao departamento médico do time profissional, indicando uma tentativa do clube de intensificar o tratamento. Durante todo esse período de recuperação e tratamentos, o contrato de Kauê com o Corinthians precisou ser renovado em diversas ocasiões. A legislação trabalhista protege jogadores que sofrem lesões durante a vigência de seus contratos, impedindo que sejam dispensados nestas condições, o que prolongou sua vinculação ao clube mesmo com a carreira em xeque.
Pressão Psicológica e Medicamentos Inadequados: A Soma de Frustrações
Além das dores físicas e da frustração com os tratamentos médicos, Kauê relata ter vivenciado um período de intensa pressão psicológica dentro do clube. A falta de melhora em seu quadro clínico, a persistência das dores e a sensação de descaso teriam levado o departamento médico a sugerir que o problema era de ordem psicológica. Um médico do Corinthians teria receitado um medicamento, identificado como Velija 30mg (cloridrato de duloxetina), sob a alegação de que a dor era “coisa da sua cabeça”, voltado para ansiedade e outros fatores psicológicos. Essa abordagem gerou desconfiança em Kauê, que sabia que a dor era genuína e física.
A duloxetina, conforme informações do fabricante, é indicada para o tratamento de transtorno depressivo, dor neuropática, e estados de dor crônica em pacientes com mais de 40 anos com osteoartrite de joelho, além de transtorno de ansiedade generalizada. O médico Leonardo Hirao, responsável pela receita, que não faz mais parte do departamento médico do Corinthians, justificou o uso do medicamento como uma estratégia para lidar com a dor crônica, buscando reprogramar um padrão prolongado de dor e auxiliar na reabilitação. No entanto, Kauê interpretou essa medida como uma tentativa de invalidar seu sofrimento e mascarar o problema real em seu joelho, agravando ainda mais seu estado emocional e sua desilusão com o clube.
O Fim da Linha: A Dispensa e a Busca por um Novo Caminho
Em abril do ano passado, após três anos da lesão e sem ter entrado em campo para uma partida oficial, Kauê foi dispensado pelo Corinthians. A essa altura, sua carreira como jogador já estava severamente comprometida. Nos meses seguintes, ele ainda tentou uma breve passagem por clubes de Goiás, como Itaberaí e Inhumas, mas em 2025, após apenas 20 minutos em campo, a falta de força no joelho direito o forçou a tomar a dolorosa decisão de pendurar as chuteiras. O momento foi de profunda angústia, com relatos de dificuldade para respirar e choro intenso, em uma crise emocional que ele associava à ansiedade, mas que sabia ter raízes profundas em sua luta solitária contra a dor e a frustração.
Atualmente, Kauê vive com sua namorada em Diadema, e sua principal esperança reside no início do pagamento da pensão determinada pela Justiça para custear uma terceira cirurgia no joelho, essencial para sua recuperação e retorno a uma vida com mais qualidade. A dor constante ao simples ato de pisar no chão é um lembrete diário do que perdeu. Paralelamente à recuperação física, Kauê planeja iniciar uma formação universitária no próximo ano e se reinserir no mercado de trabalho. Ele busca se reencontrar, esquecer o “Kauê jogador de futebol” e descobrir quem é hoje, enfrentando as limitações que o impedem de realizar atividades básicas como pegar peso, agachar ou ficar sentado por longos períodos. O desejo maior é que seus pais não precisem mais ouvir que sua vida “acabou”, mas sim que ele está construindo um novo futuro, mesmo que longe dos gramados que um dia foram seu grande sonho.

Escritor especializado em cobrir notícias sobre o mundo do futebol. Apaixonado por contar as histórias por trás dos jogos e dos jogadores







