O Racing Club de Avellaneda, gigante do futebol argentino, enfrenta um momento crucial na atual edição da Copa Libertadores da América. O clube busca uma vaga na segunda final de sua história no torneio continental, após ter conquistado o título em 1967. Atualmente, a equipe argentina precisa reverter a desvantagem na semifinal contra o poderoso Flamengo para ter a chance de disputar a decisão. Paralelamente à sua trajetória esportiva, o Racing possui uma história fascinante de superação, marcada por uma profunda crise financeira no final do século XX e por um modelo de gestão pioneiro, que envolveu a criação de uma empresa para administrar seu futebol. Essa reviravolta não apenas salvou o clube da extinção, mas também o recolocou no cenário de protagonismo no futebol sul-americano.
A Queda e a Beira da Falência: O Racing no Limite
O final da década de 1990 foi um período sombrio para o Racing. As dívidas se acumularam de forma assustadora, atingindo a marca impressionante de 30 milhões de dólares. A situação se tornou insustentável, e em 4 de março de 1999, a Justiça argentina foi forçada a decretar a falência do clube. O futuro parecia incerto e desolador. Poucos dias após essa decisão judicial drástica, os torcedores do Racing protagonizaram um momento de profunda emoção e resistência. Eles lotaram o Estádio Presidente Perón, carinhosamente conhecido como El Cilindro, para o que poderia ter sido o último jogo de sua amada agremiação. A paixão e a fidelidade da torcida demonstraram a força de um clube centenário, que se recusava a desaparecer.
O Modelo Inovador: Blanquiceleste S/A e a Recuperação Financeira
Felizmente, a história do Racing não terminou ali. O clube recebeu uma “segunda chance” e soube aproveitar essa oportunidade para se reestruturar. No ano 2000, um marco foi estabelecido com o lançamento da Blanquiceleste S/A. Essa sociedade anônima foi criada com o intuito de gerenciar as atividades futebolísticas do clube, uma iniciativa audaciosa para a época. Na Argentina, a Associação do Futebol Argentino (AFA) possuía regras que impediam que um clube se tornasse uma Sociedade Anônima Desportiva (SAD), algo similar às SAFs que se tornaram comuns no Brasil. Para contornar essa restrição, o Racing adotou um modelo de “gerenciamento”, onde a gestão de suas atividades era entregue a terceiros. Essa estratégia permitiu a profissionalização da administração e a captação de recursos, abrindo um novo capítulo na história da instituição.
O Retorno Triunfal e os Desafios da Gestão Empresarial
A nova estrutura de gestão rapidamente trouxe resultados esportivos. Em 2001, apenas um ano após a criação da Blanquiceleste S/A, o Racing conquistou o Torneio Clausura do Campeonato Argentino. Sob o comando do técnico Reinaldo “Mostaza” Merlo, o clube levantou seu primeiro troféu sob a administração da nova empresa, reacendendo a chama da glória. No entanto, o entusiasmo inicial logo deu lugar a novos desafios. A gestão empresarial, apesar de suas promessas, enfrentou suas próprias crises. Ao longo de oito anos, a companhia foi alvo de dez pedidos de falência, o que evidenciou a complexidade e os obstáculos inerentes à tentativa de gerir um clube de futebol nos moldes de uma empresa. Essa instabilidade forçou o Racing a retomar o controle de suas operações em 2008.
Restauração da Estabilidade e o Protagonismo Atual
A partir de 2008, o Racing iniciou um processo de recuperação e consolidação. Em 2013, Víctor Blanco assumiu a presidência do clube. Sob sua liderança, e ao longo de mais de uma década, o Racing dedicou-se a uma reestruturação financeira sólida e a uma gestão cada vez mais profissional. Essa dedicação aos alicerces do clube permitiu que ele recuperasse seu protagonismo no futebol argentino e sul-americano. Os frutos dessa organização foram colhidos em títulos importantes. Ainda sob a administração de Blanco, o Racing sagrou-se campeão da Copa Sul-Americana em 2024 e da Recopa Sul-Americana em 2025, reafirmando sua posição como uma força competitiva no continente. No final do último ano, o clube elegeu Diego Milito, um dos maiores ídolos de sua história, como seu novo presidente, sinalizando a continuidade do projeto de excelência e a valorização de suas lendas.
O Legado do Racing e a Lenda da “Maldição”
A trajetória do Racing é um estudo de caso notável sobre resiliência e adaptação no mundo do futebol. A superação da falência e a implementação de um modelo de gestão empresarial inovador, mesmo com seus percalços, demonstraram a capacidade de reinvenção do clube. O Racing se tornou pioneiro em buscar uma estrutura administrativa mais moderna e profissionalizada em um cenário ainda incipiente de profissionalismo no futebol argentino. O modelo, embora tenha precisado de ajustes e adaptações à realidade local, serviu de exemplo e gerou debates sobre o futuro da gestão esportiva. Essa jornada de altos e baixos, de crises e renascimentos, ajudou a construir a mística em torno do clube, alimentando lendas e histórias, como a da suposta maldição que teria sido lançada sobre o Racing, uma narrativa que contrasta com a impressionante capacidade de superação demonstrada ao longo de sua história.

Escritor especializado em cobrir notícias sobre o mundo do futebol. Apaixonado por contar as histórias por trás dos jogos e dos jogadores







