O Corinthians está na vanguarda da inovação no futebol brasileiro ao implementar uma sala de treinamento cognitivo de ponta em seu Centro de Treinamento Dr. Joaquim Grava. Esta iniciativa pioneira visa aprimorar o desempenho mental dos atletas, complementando o treinamento físico tradicional e preparando o elenco para os desafios cada vez mais intensos do esporte moderno. A estrutura conta com equipamentos de última geração, como telas interativas e óculos de realidade virtual, dedicados a exercitar o cérebro com a mesma precisão com que se treinam os músculos.
A Nova Fronteira do Desempenho: Mente de Campeão
A mentalidade no esporte de alto rendimento transcendeu a mera preocupação com a saúde. O preparador mental Lulinha Tavares, contratado em janeiro e responsável por esta nova área inaugurada em maio, enfatiza que o foco agora é a “performance mental”. Segundo ele, essa performance se desdobra em duas frentes cruciais: o autoconhecimento e a autorregulação do atleta – o que inclui o controle da ansiedade, respiração e batimentos cardíacos – e o aprimoramento de habilidades cognitivas como atenção, tempo de reação, visão periférica e controle de impulsividade. Todos esses elementos convergem para a tomada de decisão rápida e eficaz, aspecto considerado a nova fronteira no desenvolvimento de atletas de elite.
Em um esporte onde cada milissegundo pode definir o resultado de uma partida, a capacidade de processar informações e reagir com agilidade é tão vital quanto a força física. A sala de treinamento cognitivo surge como um espaço estratégico que une ciência e tecnologia para refinar essas capacidades, atuando como um complemento indispensável à rotina de treinamento convencional.
Rotina e Adesão Voluntária: O Caminho para a Alta Performance
Diariamente, antes de pisarem no gramado para os treinos físicos, os jogadores do Corinthians passam por avaliações fisioterapêuticas e realizam ativação física na academia. Paralelamente, uma parcela do elenco tem frequentado a sala de treinamento cognitivo. A adesão a estas atividades não é obrigatória, mas se baseia no convencimento dos atletas sobre os benefícios que podem ser extraídos. O objetivo é que a percepção do ganho de performance motive a participação.
Um exemplo notável é o atacante Gui Negão, que inicialmente demonstrava receio em participar das atividades. Contudo, após experimentar os benefícios, tornou-se um dos jogadores mais assíduos. Ele compartilha sua experiência: “Antes eu tinha medo de ir lá. O pessoal que fazia era mais experiente e eu tinha receio de ir e fazer errado. Mas hoje eu acho muito importante para os treinos e os jogos, ajuda na concentração, na atenção e na tomada de decisões.” Gui Negão agora se junta a outros entusiastas como Yuri Alberto, André Ramalho, Cacá e Felipe Longo, frequentando a sala de treinamento diariamente. Atualmente, cerca de dez atletas passam pela sala por dia, demonstrando o crescente interesse e reconhecimento da importância dessa ferramenta.
Tecnologia a Serviço da Mente: Exercícios que Desafiam e Aprimoram
A sala é equipada com uma variedade de exercícios que visam estimular diferentes áreas do cérebro. Um dos preferidos de Gui Negão, por exemplo, utiliza óculos que simulam piscadas que vedam partes da visão. O desafio consiste em identificar e verbalizar uma letra em um quadro, enquanto simultaneamente se executa um toque em uma bola com a perna indicada em uma lista. Lulinha Tavares explica que essa atividade estimula o desenvolvimento cerebral, pois o cérebro é levado a “completar” as informações visuais ausentes. Essa capacidade de adaptação e preenchimento é fundamental para a neuroplasticidade, que permite que os neurônios se capacitem, resultando em reações mais rápidas.
O atacante lidera o ranking no exercício “toque rápido”, onde o objetivo é tocar em círculos que surgem em uma tela interativa o mais rápido possível, dentro de um limite de 60 segundos. Com 114 pontos, seu tempo de reação médio é de 526 milissegundos, demonstrando uma agilidade impressionante.
Outra atividade popular é o “trilhas de números”, que exige que o jogador toque em círculos com números na sequência correta (do menor para o maior). Este exercício é especialmente eficaz no aprimoramento do raciocínio lógico e da atenção sustentada, sendo Felipe Longo o atual líder nesta modalidade. A proposta é clara: preparar os atletas para tomar as melhores decisões possíveis, no menor tempo, seja em momentos de exaustão ou no início da partida, garantindo que a mente esteja tão afiada quanto o corpo.
A Era do Cérebro: Evolução Inevitável no Futebol
A importância do treinamento cognitivo é reforçada pelo próprio Lulinha: “O seu cérebro é treinável. O cérebro não discerne o que é real e o que é imaginário. O cérebro fica treinado, assim como a musculatura fica treinada. Com isso, a tomada de decisão fica muito melhor.” Yuri Alberto, um dos grandes defensores do projeto, corrobora essa visão: “Eu estou melhorando bastante meu foco, porque a gente está fazendo bastante coisa bem positivas com o Lulinha. Tem sido muito positivo para nós. Eu já tenho hiperfoco dentro do jogo, mas, para alguns que não têm, poder treinar controle de impulsividade, agilidade e reação, tem sido muito positivo para nós.”
Lulinha estende a atuação para além do CT, acompanhando o elenco em jogos e levando atividades cognitivas para o vestiário antes das partidas. Ele argumenta que, assim como os atletas dedicam um tempo considerável ao aquecimento físico, é igualmente crucial treinar a mente, os olhos e os níveis neurológicos e de concentração. O executivo Fabinho Soldado vê o projeto como uma evolução natural e necessária, posicionando o Corinthians como um dos pioneiros no Brasil nesse aspecto. “Comprovadamente o futebol de alto rendimento é de detalhes, e esse departamento vem para ajudar para que os atletas possam, com o treinamento mental, terem foco maior a cada jogo. E que o clube consiga, ao final, ter um atleta melhor preparado para ajudar o Corinthians em busca de seus objetivos.”
A expectativa é que, a partir do próximo ano, testes cognitivos sejam parte integrante das avaliações de início de temporada, assim como os exames médicos e físicos. Isso permitirá um monitoramento detalhado e a potencialização do desenvolvimento individual de cada atleta. Victor Cavallari, psicólogo do esporte e especialista em neurociência, ressalta a crescente importância desta área: “Cada vez mais os profissionais do esporte têm trazido a neurociência como ponto diferencial para o dia a dia de trabalho. A próxima evolução do esporte é a evolução neurocientífica. É explorar mais a capacidade cognitiva, porque o corpo já está chegando ao limite. Sono, nutrição, fisiologia, recuperação física, treino de força, treino de potência, tudo isso já vai chegar no limite. Só que a gente não explorou muito o cérebro ainda. Chegou a era do cérebro.”

Escritor especializado em cobrir notícias sobre o mundo do futebol. Apaixonado por contar as histórias por trás dos jogos e dos jogadores







